Publicado em 06/08/2023.
O Instituto Histórico e Geográfico de Congonhas realizou neste sábado (5), o 3º Passeio Cultural de 2023 com a presença de seus confrades e confreiras, além de convidados e dos amigos do “4X4” sob a batuta do Agente de Turismo Embaixador da Estrada Real, Membro do Caminho de São Thiago e Membro Fundador do JeeProfetas – José Carlos Gomes, o afamado Tarol, que enriqueceram o passeio.
Como anunciado, o destino foi a aprazível cidade vizinha de São Brás do Suaçuí. E de antemão destacamos que foi mais um espetacular passeio cultural. Espetacular por vários motivos: receptividade, atrativos culturais, pontos geográficos, cordialidade e claro, muita entrega por parte da Confreira Correspondente do IHGC - Maria Auxiliadora Mendes da Silva e Souza (Dorinha), que se esmerou para nos receber neste sábado de céu anil e ensolarado. E aproveitamos o ensejo para agradecê-la em especial, e aos seus familiares e amigos que nos proporcionaram um dia memorável.
E o primeiro local visitado foi próximo à Fonte do Lava Pés - onde participamos honradamente da solenidade do descerramento da placa alusiva ao limite norte da sesmaria concedida a João Machado Castanho em 1713, uma proposta feita pela Confreira Dorinha e que contou com o patrocínio e o apoio irrestrito do Prefeito Municipal Sr. Geraldino Pacheco de Oliveira Filho, a quem o IHGC agradece. Cabe destacar que nos municípios limítrofes a Congonhas, somente em São Brás do Suaçuí encontramos a pedra utilizada como marco demarcatório das sesmarias - ainda com as inscrições da Coroa Portuguesa. Um fato histórico, raro e de muita relevância para a historiografia regional. A solenidade de descerramento da placa foi conduzida pela Secretária de Educação de São Brás do Suaçuí, a Sra. Rosa Cristina de Souza Franco que agradeceu a presença do IHGC.
Após o ato protocolar seguimos para o segundo local programado para a visitação: a Capela devotada ao Senhor dos Passos que se localiza majestosamente na entrada norte da cidade, na Praça Ministro Olavo Drumond, no secular caminho da Estrada Real, onde fomos acolhidos pela Sra. Rosa.
A capela construída provavelmente em meados do século XIX foi reconstruída entre 1913-1916 preservando-se, segundo fontes orais, o altar e o coro feitos em madeira. É um bem tombado pelo Município que tem um estilo arquitetônico eclético e abriga, entre outras imagens, a do Senhor dos Passos, feita em roca por um artífice local ou morador no local, conhecido no meio acadêmico como o “Santeiro de Suaçuí” ou entre alguns moradores como “Vô Pequetito”. Nessa capela, casaram-se em 1869 Francisco Fernandes de Oliveira Pena e Julia Henriques Tavares, bisavós paternos de Dom Rodolfo das Mercês de Oliveira Pena, um bispo católico nascido em Congonhas.
Terminada essa visitação fomos recebidos pela anfitriã em sua residência para um café colonial mineiro – um saboroso “café com história”, onde repusemos nossas energias para seguir adiante. Ainda em sua casa, Dorinha nos mostrou parte de seu rico trabalho de pesquisas documentais: uma galeria dos principais documentos encontrados entre 1713 (carta de sesmaria) até 1834 (relação dos habitantes do distrito, um livreto original exposto pela primeira vez ao público) e dispostos em ordem cronológica. Um tesouro documental que mostra como viviam as pessoas nesse período, com seus costumes e regras, não só em São Brás do Suaçuí, mas também em nossa região como a atividade do tropeirismo.
Com energias repostas, seguimos para a igreja Matriz de São Brás. Uma joia da arte religiosa mineira e única devotada à São Brás em toda nossa região. Fomos recebidos pela senhora Cleuza Costa. Dorinha fez, com maestria, a narrativa dos principais elementos devocionais e artísticos que se encontram no interior da igreja, destacando a cantaria presente nas escadas externa e interna, no arco do cruzeiro, nos nichos, nos púlpitos e pia batismal e os cinco retábulos representativos do estilo rococó, provavelmente feitos pelo artífice português Felipe Vieira que me 1764 morava no Arraial de Suaçuí e vivia de seu ofício de escultor. Sobre a construção ou reconstrução da capela, que já existia desde 1725, informou que a planta da edificação observa recomendações das Constituições Primeiras do Bispado da Bahia de 1707 e que o templo hoje existente deve ter sido construído ou reconstruído pelo mestre-de-obras português José Pereira dos Santos que se casou com uma suaçuiense e residiu em Suaçuí até 1802, onde e quando faleceu.
Outra informação importante divulgada foi o fato da capela construída ou reconstruída no século XVIII já ter sido feita com as duas torres e não apenas com uma como se acreditava até 2022. Nesse sentido, citou o testamento do açoriano João Gonçalves Leonardo feito em 1792 no qual deixou uma verba para conserto das torres e uma publicação jornalística de 1864 que noticiava estar toda a fachada e a torre da esquerda (à direita de quem entra pela porta principal) desmanchadas até o alicerce.
Sobre as imagens existentes no templo religioso, Dorinha destacou a da Senhora das Dores e do Senhor Morto, ambas atribuídas ao “Santeiro de Suaçuí” ou “Vó Pequetito”, às de São Benedito e de Santa Efigênia que poderiam ser de autoria do Mestre Cajuru, conforme publicação organizada por Beatriz Coelho em 2005, e a de São Miguel (tombada pela Municipalidade) que poderia ser de autoria do Mestre Piranga, de acordo com análise feita pelo restaurador Carlos Magno de Araújo. Por fim, foi nos apresentado o painel do Cristo Sorrindo, de autoria da artista suaçuiense Maria Fatima Marques Amâncio, considerado à época de sua criação como o único existente no mundo.
Toda essa exposição foi intercalada com a participação do paulistano Gilmar Martins Gonçalves que tocou e cantou a Trezena de Santo Antônio, emocionando a todos. Em Suaçuí, a devoção à Santo Antônio, assim como a São Brás e a São Sebastião, é muito forte. Entre 1850 e 1900, 13% dos meninos batizados na freguesia receberam o nome de Antônio na pia batismal. Foi o nome mais popular no período citado.
Em seguida ouvimos a fala do Padre Luciano Ferreira de Oliveira, pároco de São Brás do Suaçuí, que calorosamente nos acolheu com sua palavra pastoral e demonstrou toda sua alegria com nossa presença. Salientou também que São Brás do Suaçuí deva fazer parte do Caminho de São Thiago, rota importante que impulsiona o turismo (em suas variadas facetas) em nossa região. Neste momento, Tarol lembrou que São Brás do Suaçuí faz parte da Estrada Real e do CRER – Caminho Religioso da Estrada Real, e que existe a possibilidade de serem criados alguns outros caminhos que possam conectar, por exemplo, São Brás do Suaçuí ao Caminho de São Thiago. Tarol ofereceu também ao Padre Luciano a imagem peregrina de Nossa Senhora Aparecida para percorrer as casas dos moradores de São Brás do Suaçuí. Essa imagem já percorreu, em um Jeep Willys, a rota entre o Santuário de Nossa Senhora da Piedade (padroeira de Minas Gerais) até o Santuário de Nossa Senhora Aparecida, em Aparecida/SP.
Padre Luciano presentou o IHGC com um suvenir da Igreja Matriz de São Brás, que muito nos orgulhou pelo carinho e receptividade e em seguida abençoou a todos com a benção e oração de São Brás.
Com o espírito leve e sob a proteção divina, seguimos para o próximo ponto, bem ao lado da igreja Matriz: o casarão que pertenceu à “Dona Negrinha”, que atualmente pertence ao seu neto Vicente Ribeiro do Vale Filho, que generosamente autorizou nossa visita ao interior da edificação. Uma construção do século XIX que ainda preserva sua característica original, com piso de madeira e porão, pé direito de mais de 4 metros e mobília e pertences dos antigos moradores. O casarão está sob o cuidado da Sra. Regina que diariamente o mantém aberto, ventilado e limpo. Casarão esse já tombado pelo Poder Executivo Municipal como Patrimônio Material de São Brás do Suaçuí e com potencial para ser transformado oficialmente (pois já o é) em um museu, proporcionando o incremento cultural e turístico na cidade.
Ao lado desse casarão avistamos a fachada da casa construída 1943 pelo primeiro prefeito eleito de São Brás do Suaçuí, Severiano Antônio da Costa, e pouco adiante o Passo do Encontro Doloroso, tombado pelo Município.
Pegamos novamente a estrada e seguimos para a região conhecida como “Campo dos Melados”, onde se localiza da Usina de Triagem e Compostagem de São Brás do Suaçuí. É nesse local, em seu jardim, que se encontra protegida a pedra que marcou o limite norte da sesmaria concedida a João Machado Castanho em 1713, como mencionamos acima. A pedra – marco de uma sesmaria, é a única conhecida em nossa região. Fomos recebidos pelo funcionário da Prefeitura Municipal, Sr. Nelson Pyramo, que participou entre 2004 e 2005 da atividade de remoção da pedra da Fonte do Lava Pés para os jardins da Usina, e foi quem indicou à Confreira Dorinha o local onde ela estava originalmente.
Em seguida nos dirigimos ao nosso último ponto histórico programado nesta visita: o “Suaçuí Mirim” – distante cerca de 6km da área central da cidade. Foi nesse local que o viajante e naturalista inglês Richard Burton passou em 26/06/1867, descrevendo em seu diário o que encontrou nessa região. Desse ponto avistamos também a região do “Cocuruto”, onde o geólogo e metalúrgico alemão Wilhelm Von Eschwege – contratado pela Coroa Portuguesa, mapeou em 1811 as ricas jazidas de manganês em solo brasileiro. Cem anos depois a Cia. A. Thun Mineração iniciaria a lavra do minério no local, construindo inclusive um ramal férreo que se conectava com a Estrada Ferro Central do Brasil nas imediações de Queluz (atual Conselheiro Lafaiete) para escoar sua a produção.
Fizemos uma parada no local hoje conhecido como Cruz das Almas, onde Dorinha apontou-nos as regiões onde se localizavam possivelmente a roça de João Machado Castanho e as propriedades das famílias Mendes da Cruz, que em 1717 já residia no local, e das famílias Silva e Silva Leão. O último ponto de parada foi o alto do Lopes, onde avistamos o local onde foi construída a morada de João Lopes Teixeira Chaves, fazendeiro e juiz de paz da Freguesia de São Brás do Suaçuí. Essa propriedade foi descrita por Richard Burton como uma fazendola com uma bonita casa pintada de branco.
Nesse momento, nossa anfitriã compartilhou conosco sua intenção de deixar registrado no livro que está escrevendo sobre as raízes de Suaçuí as coordenadas geográficas dos marcos e moradias dos séculos XVIII e XIX, hoje inexistentes, mas identificados em sua pesquisa documental e reforçou ao Tarol o convite feito ao JeeProfetas para participar do processo de mapeamento desses pontos, atividade essa que ela preliminarmente batizou como “Expedição dos Manuscritos”.
Ao final desta última visita retornamos a área central de São Brás do Suaçuí para saborearmos um delicioso almoço mineiro preparado com esmero pela Tia Marga (Margarida Amâncio), momento de confraternização e descontração entre os participantes desse maravilhoso passeio.
Retornamos a Congonhas embebidos de novos aprendizados sobre São Brás do Suaçuí, o que até o início deste passeio não conhecíamos. Foi uma oportunidade ímpar de ampliarmos nosso conhecimento cultural, gastronômico e de saberes desse sublime Município fronteiriço ao de Congonhas.
Que venha o próximo!
Agradecemos a AG Turismo (31 99794-0924) pelo traslado, sempre com pontualidade, conforto e segurança.
Fotos: Jonathan Reis, Guilherme Fontainha, Flávio Almeida, Maria da Paz, Rosa Cristina de Souza Franco.