O Instituto Histórico e Geográfico de Congonhas (IHGC) realizou neste sábado (8 de abril), o 1º Passeio Cultural de 2023 cujo destino foi o município vizinho de Conselheiro Lafaiete.
Como estamos no mês de abril, o passeio cultural foi em alusão ao feriado cívico nacional de 21 de abril, enaltecendo a figura de Joaquim José da Silva Xavier (Tiradentes) e os demais conjurados.
O primeiro ponto do roteiro a ser visitado foi a encantadora capela devotada à Nossa Senhora da Conceição da Passagem do Gagé, edificada na primeira metade do século XVIII, onde ao seu redor floresceu uma pequena comunidade que, durante a década de 1970, foi suprimida em virtude da construção da Usina Siderúrgica Arthur Bernardes pela Açominas, atualmente pertencente ao grupo Gerdau.
Bem próximo da capela vemos o córrego da Passagem, um curso d'água fruto de um desvio de águas para permitir que mineradores à cata do ouro tivessem água em abundância para a lida diária, no longínquo século XVIII.
E assim surgiu o pequeno arraial da Passagem do Gagé e sua capela. Após o declínio da produção aurífera, a capela e seu acervo tiveram vários proprietários: desde o padre Silvestre da Silva, passando por João José Silvestre, Joaquim Lourenço Baeta Neves, Daniel Lourenço Baeta Neves e, por fim a Antônio Pedro Baeta Neves, o que acabou gerando uma demanda judicial para decidir, de fato, a quem pertencia importante patrimônio colonial. No limiar do século XX o vigário de Queluz, Padre Américo Adolpho Taitson, fez uma brilhante defesa do patrimônio eclesiástico pondo fim à contenda.
Tivemos o privilégio de ver a capela em uso pela comunidade: estavam reunidos para um retiro espiritual. O grupo ali reunido recordou a saudosa amiga e Confreira Avelina Noronha que defendia a possibilidade de o arraial da Passagem do Gagé ser anterior ao surgimento do arraial dos Carijós, por ser habitado pelos indígenas em fins do século XVII.
Finda a visita à Capela seguimos para a Estalagem da Varginha do Lourenço, outro ponto icônico e histórico de Conselheiro Lafaiete, localizado ao lado do Caminho Novo - Estrada Real. Trata-se de um sítio formado pelas ruínas da antiga edificação Estalagem da Varginha e uma gameleira centenária. No Sítio da Varginha do Lourenço ocorreu um dos episódios da insurreição planejada em Minas Gerais entre 1788 e 1789 e conhecida como Inconfidência Mineira. O movimento sedicioso foi articulado por homens de diferentes posições econômicas e sociais das comarcas de Vila Rica e do Rio das Mortes e tinha objetivos bastante diversos, dentre eles a implantação de uma república, a criação de uma universidade e o incentivo às indústrias têxteis e metalúrgicas. Diversos inconfidentes citam o Sítio da Varginha do Lourenço nos Autos de Devassa da Conjura Mineira como um dos lugares onde teria se falado sobre o levante.
Na estalagem da Varginha, que pertenceu a João da Costa Rodrigues, o Alferes Tiradentes falou ao proprietário e a Antônio de Oliveira Lopes sobre a sedição, tendo o proprietário repetido as palavras do alferes com o padre Manoel Rodrigues da Costa, o capitão João Dias da Mota e Basílio de Brito Malheiros. Era a noite de 23 de dezembro de 1788 e ao ouvir o anúncio de Tiradentes, Antônio de Oliveira Lopes se ofereceu para “fazer a dúzia”, ou seja, já eram 11 os conjurados e Antônio de Oliveira Lopes já se considerava o 12º elemento. Em seguida, Tiradentes teria proposto um brinde aos novos líderes que iriam, no ano de 1789, assumir o governo da capitania, ignorando a presença do recém nomeado governador. O reinol Basílio de Brito Malheiros denunciou a todos no início de abril de 1789.
Foram julgados mais de trinta inconfidentes, pois não só os chefes da conjuração e os ajudadores da rebelião se constituíram réus do crime de lesa-majestade da primeira cabeça, mas também os sabedores e consentidores dela pelo seu silêncio. Alguns foram condenados à “morte natural para sempre”, outros ao degredo por toda a vida ou por dez anos, poucos foram absolvidos e um foi condenado às galés por dez anos. O perdão da rainha Maria I, no entanto, livrava os inconfidentes da pena capital, mudando-a para o degredo perpétuo ou por alguns anos, na África. O único condenado à morte foi Tiradentes, por ter sido considerado “indigno da real piedade da mesma Senhora”.
Na Varginha do Lourenço, embaixo de uma frondosa gameleira foi exposto um dos quartos de Tiradentes, executado em 21 de abril de 1792. João da Costa Rodrigues e Antônio de Oliveira Lopes, que ali tiveram contato com Tiradentes, foram degredados por dez anos para Moçambique, na nau Princesa de Portugal (para Mossuril e Mucuá). João Dias da Mota e o Padre Manuel Rodrigues da Costa foram também degredados, o primeiro para Cabo Verde (Cachéu), por dez anos, e o segundo para Portugal (Lisboa), na mesma fragata Golfinho.
Em 1881 a Estalagem do Lourenço recebeu a visita ilustre de Dom Pedro II, Imperador do Brasil, quando de sua viagem à Minas Gerais. Dom Pedro II descreveu o local e viu o banco, feito de maçaranduba, onde os conjurados brindaram a chegada da futura república.
A Estalagem do Lourenço permaneceu de pé até 1950, quando foi demolida. Quando da instalação da Açominas na região, a mesma adquiriu a área e ergueu ali, em 1989, um monumento em pedra sabão, de autoria do artista plástico congonhense Raul Santiago, em homenagem ao Bicentenário da Inconfidência Mineira. Em 2009, a posse do local foi transferida para a Ordem dos Cavaleiros da Inconfidência Mineira, que se tornou responsável, por um período, por sua manutenção além de promover ações, como cavalgadas e caminhadas, como forma de valorização do sítio e da memória da Inconfidência.
Atualmente o local se encontra desassistido, mas tivemos notícias de que a Prefeitura de Conselheiro Lafaiete tem buscado meios para revitalizar o local e promover ações culturais para sua valorização.
Deixamos o sítio da Varginha e seguimos para o Solar do Barão do Suassuy, localizado na região central de Conselheiro Lafaiete. Foi uma das primeiras edificações do antigo arraial do Campo Alegre dos Carijós e nela residiu José Ignácio Gomes Barbosa (Barão de Suassuy). Tempos depois foi a morada do inconfidente padre Fajardo, implicado nos Autos da Devassa da Conjura Mineira. Serviu posteriormente como sede da Câmara Municipal, da Faculdade de Comércio Exterior, como escola municipal e por último como sede de um clube recreativo que marcou uma geração de frequentadores entre as décadas de 1980 e 1990, conhecido como "Castelinho".
A construção é majestosa e possui 17 cômodos, representando a arquitetura colonial típica do século XVIII (telhado corrido, pátio interno, calçamento com pedras, senzalas e capela). Sua frente imponente chama a atenção, com sacadas de pedra e grades de ferro bem trabalhadas. Hoje é um centro cultural, com salas de exposição, galerias, auditório, biblioteca, memorial das Violas de Queluz, além de abrigar a Secretaria de Cultura de Conselheiro Lafaiete.
Em seguida fomos conhecer a Casa de Cultura Gabriela Mendonça, instalada em um dos casarões mais antigos de Conselheiro Lafaiete, construído no princípio do século XVIII, configurando como um raro casarão setecentistas da cidade. Foi edificado em pedra e pau-a-pique. Está situado na rua Comendador Baeta Neves (antiga rua Direita).
O casarão passou a pertencer no final do século XIX ao tenente-coronel José Augusto Moreira de Mendonça, homem de grande influência e prestígio em Queluz (Conselheiro Lafaiete). Além de ter sido coletor municipal, estadual e o primeiro coletor federal, era Pai da renomada professora Gabriela Mendonça, que atualmente empresta seu nome à edificação. Em 1988 foi transformado em casa de cultura e artes, sendo reformado em 1994. Em 2014 o casarão foi fechado para nova reforma, sendo recuperado e devolvido à comunidade lafaietense em setembro de 2022.
O próximo local que visitamos foi a Igreja Matriz de Nossa Senhora da Conceição, edificação do primeiro quarto do Século XVIII, de construção sólida e estrategicamente posicionada. Sob a invocação da padroeira Nossa Senhora da Conceição, a Paróquia foi instituída pelo bispo do Rio de Janeiro, Dom Francisco de São Jerônimo e foi a 13ª de Minas Gerais, em ordem cronológica.
Seu interior não possui grande riqueza em detalhes, mas sua construção é um belo exemplar da arquitetura barroca. Em seu interior estão sepultados os restos mortais do Barão de Pouso Alegre e o da baronesa, bem como as cinzas do patrono da cidade, Lafayette Rodrigues Pereira. Se localiza defronte à Praça Barão de Queluz.
Foi em frente a Igreja Matriz que se desenrolou um dos marcantes episódios da Revolução Liberal de 1842: na manhã do dia 27 de julho, o adro da Matriz Nossa Senhora da Conceição estava sobre o controle dos insurgentes liberais, sendo Queluz retomada do controle dos legalistas. No dia 26 de julho de 1842, os rebeldes de Queluz derrotaram fragorosamente as tropas do Exército Imperial, sob o comando de Galvão Alvarenga. A Batalha de Queluz abria caminho para tomar de assalto a capital, Ouro Preto. A vitória que obtiveram acendeu a chama revolucionária.
Para finalizar o 1º Passeio Cultural de 2023, visitamos a praça Barão Tiradentes de onde pudemos contemplar o lindo chafariz, datado de 1881, e a fachada imponente do Museu Perdigão, antigo edifício que serviu de cadeia e onde ficou ali preso por 16 meses o afamado médium congonhense José Pedro de Freitas, o Zé Arigó entre os anos de 1964 e 1965.
Por ter sido o passeio realizado no Sábado de Aleluia (feriado prolongado), nos deparamos com os edifícios Solar do Barão de Suassy, Casa de Cultura Gabriela Mendonça e Museu Perdigão, além da Igreja Matriz de Nossa Senhora da Conceição, naturalmente fechados. Mas isso não diminuiu o entusiasmo do grupo do IHGC que soube aproveitar esse momento para ampliar o conhecimento histórico com a troca de informações.
O IHGC protagonizou nos últimos 12 meses, 6 passeios Culturais pela região limítrofe a Congonhas, oportunizando aos seus Confrades, Confreiras e convidados, conhecimento da rica história regional e exaltando o potencial turístico desses locais.
E o próximo passeio cultural já está definido: será no próximo mês em Belo Vale onde serão visitadas as igrejas de Boa Morte e Santana, dois maravilhosos exemplares da arquitetura barroca do século XVIII de nossa região.
Agradecimento à AG Turismo – impecáveis no traslado – Janie / Rogério – 31 99794-0924
Fotos: Flávio Almeida, Domingos Costa, Hugo Cordeiro, Guilherme Fontainha, Maria da Paz